Roberto Bolaño não está aqui para solucionar mistérios

Qual o papel do detetive na literatura? Solucionar mistérios ou ser racional e achar sentido na barbárie de um crime? Para o escritor chileno Roberto Bolaño, nenhuma das duas respostas é uma alternativa válida.

Formulaica, genérica, repetitiva, popular e pouco acadêmica é a reputação dada a literatura policial na cultura pop, com figura elementar do detetive intelectual, austero à sociedade e paralelamente uma extensão da lei e leal ao sistema de vigiar e punir.

Para alguém que despreza as instituições literárias e acadêmicas como Bolaño, era irresistível usar essas narrativas como antítese aos valores dessa sociedade.

“A atração de Bolaño com esse gênero tem muito a ver com outras formas de conhecimento, de pensar, de escrever, que não sejam institucionais e, olhando para origem da literatura policial, ela vem de uma tradição de autores que subverteram a literatura. Então, ela já nasceu na subversão”, afirma Raquel Vieira Parrine, doutoranda no Programa Língua e Literatura Românica na Universidade do Michigan.

De acordo com Parrine, o detetive de Bolaño não é um intérprete da lei ou um intelectual, ele é incapaz de juntar as peças do quebra-cabeça que faz parte. Ele não deixa de ser um ator da civilização, faz parte da barbárie que investiga e é guiado pelos seus instintos, um detetive selvagem.

É essa figura quase bestial de tanta humanidade que Bolaño usa como protagonista de suas narrativas, que também não seguem uma estrutura ou buscam respostas às perguntas criadas por ele mesmo.

É nessa confusão que a palavra do autor ganha força e beleza, ao não transformar sua própria história em narrativa racional ao ver um mundo de extremo horror e do que a humanidade é capaz de fazer um com o outro.

“O romance de Bolaño é todo sobre luto, você só sabe que está lendo a respeito da morte ao terminar de ler o romance inteiro; ele te convida a entrar nesse momento do crime, do horror, através do luto, e não através da racionalidade”, conclui Parrine