Influência regional: O impacto de influenciadoras em mercados locais na pandemia

Desde o surgimento da influência digital com mais rigor na última década, vários foram os grupos e redes sociais que alavancaram nomes à fama: seja em única plataforma ou compartilhando entre as várias delas os fãs e publicidades mais direcionadas. Em meio a isso há a influência digital regional, com nomes que alavancam seus mercados locais, geralmente cidades-polo ou capitais fora do eixo Rio-São Paulo, que, em meio à pandemia, inovam e impactam positivamente entregas a seus clientes, atingindo espaços como a Farofa da Gkay, festa ocorrida no início deste mês no Ceará.

Apesar de a influência regional não ser comumente usada para denominar tal grupo, ela se enquadra em outras classificações. “O que eu vejo que o mercado tem feito é nomear os influenciadores como influenciadores de nicho ou microinfluenciadores. Uma pesquisadora de uma universidade na Austrália chamada Crystal Abidin, trabalha com a noção de ‘minority influencers’. Uma ideia de influenciadores minoritários talvez. É legal usar essa definição, dá pistas para a magnitude desse fenômeno”, explica à Revista Babel, Issaaf Karhawi, jornalista, professora universitária e doutora em Ciências da Comunicação pela USP (Universidade de São Paulo).

De acordo com a plataforma norte-americana Insights For Professionals, microinfluenciadores não têm um grande número de seguidores nem status de celebridade, mas podem fazer valer o dinheiro investido por alguma marca por entregar autenticidade, atrair engajamento e possuir capacidade de construir relações pessoais com sua audiência. Geralmente, estão nesse grupo os que dispõem entre 10 mil e 100 mil seguidores. Todos aqueles da sua categoria acima, de macroinfluenciadores (até 1 milhão de seguidores), já foram um dia micro.

“A ideia de influenciar é relativamente nova. O termo influenciador digital surge no mercado em 2014/2015 justamente porque o termo blogueira e blogueiro não dava mais conta das múltiplas possibilidades de atuação. Quando se falava em blogueiro, estava muito limitado aos blogs e de repente eles não tinham mais blogs, só estavam no Instagram ou só eram youtubers. Aquela expressão não conseguia mais contemplar a atividade”, observa Karhawi, que também é pesquisadora em comunicação digital na USP.

No início da pandemia do novo coronavírus em março de 2020, houve o reconhecimento de que os influenciadores estavam em esferas sociais distantes da sua audiência. “A pandemia impactou o mercado de influência de forma geral. No começo da pandemia existia um discurso que era ‘os influenciadores ostentação estão com os dias contados. Os influenciadores que não saírem de suas bolhas estão com os dias contados. É o fim da cultura de celebridades de influenciadores digitais’. […] No entanto, a medida em que a pandemia foi avançando, as marcas perceberam que os influenciadores eram aliados para conseguir continuar conversando com os consumidores”, declara a pesquisadora.

“Logo quando veio a questão da covid eu pensava que ia durar dois meses. E só foi aumentando. No início fazíamos trabalhos de casa. Ficamos uns três meses naquele medo. As empresas mandavam os produtos e eu anunciava de casa. Não ia até às lojas. Fiquei grávida e o trabalho foi redobrado. Foram melhorando os índices e eu voltei para as lojas tomando muito cuidado”, afirma Jéssica Ingrede, formada em Pedagogia na UFAC (Universidade Federal do Acre), mãe de dois filhos e atuante em Rio Branco-AC com 257 mil seguidores.

A proposta da entrega dos produtos em casa também foi a solução vista por Luiza Leal, formada em Publicidade e natural de Santarém, no Pará, que antes da pandemia estava com 14 clientes ativos e se viu apenas com dois antes de vislumbrar melhora. “Eu falava ‘olha, a gente pode usar meu trabalho com delivery’. Para que não parasse o operacional deles. Eu tentava ajudar eles, eu queria ganhar, mas eles tinham que ganhar também. Não funcionou para todos, mas alguns estão aí até hoje”.

Em poucos meses ela recuperou sua base e quase dobrou o número de clientes. “Senti que na minha cidade teve uma valorização para o online. Em outubro de 2020 foi a época que eu mais tinha cliente, fiquei com 25 clientes. Foi quando subi os meus valores e falei para mim que não precisava abraçar todo mundo, mas trabalhar com quem me identificava. Comecei a poder me filtrar”, confessa ela, que hoje tem um público de 88 mil seguidores.

Influenciadora Daniele Lopes. Foto: Reprodução/@danielelopest

‘Nunca pensei em ser influenciadora’

“A influência digital, no meu caso, simplesmente veio para agregar a todas as atividades que eu já tinha antes. […] Eu não pensei que as coisas tomariam a proporção que tomaram, tudo aconteceu aos poucos. Conforme eu postava as pessoas iam aparecendo. Não teve um planejamento prévio ou estratégico de nada”, declara Giuliana Ferrari, professora, engenheira formada pela UFV (Universidade Federal de Viçosa-MG), moradora de São Mateus, no norte do Espírito Santo, e detentora de uma audiência de 70 mil pessoas.

Ela alcançou esse público não mostrando sua rotina profissional, que continua, mas compartilhando dicas como receitas de pratos práticos na cozinha e o dia a dia com a família: ela, a filha e o marido, que também é professor. 

Todas as influenciadoras regionais desta reportagem compartilham do mesmo ponto. Elas não imaginavam que em meio a suas carreiras, poderiam influenciar digitalmente outras pessoas. 

“Por um acaso caí nesse mundo do digital. Sempre tive as redes sociais. Era a última a entrar na rede social. Antes eu tinha Orkut e falava que amava e não ia para o Facebook. Era a atrasadinha das redes. Todo mundo ia para a rede nova e eu esperava acabar a antiga para ir”, admite Jéssica.

Ela começou nas redes primeiro para divulgar bolos que vendia, após ficar desempregada com o término do contrato de um estágio. Assim como Giuliana, ela passou a mostrar o dia a dia com a família, além de ensinar suas receitas de bolo, logo quando o Instagram adicionou sua ferramenta de vídeos diários entre 2016 e 2017. Com seu jeito descontraído e engraçado ao dar as dicas e contar seus perrengues “da vida real”, em dezembro de 2017 ela já tinha 10 mil seguidores.

“Eu meio que quebrei o ideal de blogueira que existia. Aqui na minha cidade as blogueiras eram as meninas bem arrumadas que iam para o salão. Apareciam com o cabelo escovado, todas maravilhosas. Era esse o ideal de blogueira que eu tinha. Eu só fazia vídeo, de manhã eu acordava, me mostrava nos stories. Era dia a dia mesmo. Como as pessoas não viam muito isso, pensavam ‘essa menina é doidinha, vou seguir’. E assim foi”, brinca ela.

“Nunca pensei em ser influenciadora digital e hoje me considero uma. Existe um perfil cultural muito diferente em cada lugar, inclusive no Pará. Enquanto em São Paulo as coisas acontecem de outra forma, em outra ótica, com outra velocidade para quem trabalha como influenciador hoje em dia, aqui os passos são mais lentos”, analisa Luiza, que no Instagram está no perfil @coisasdeluma. 

Do Pará, 2021 fez surgir um fenômeno brasileiro: Daniele Lopes. Com uma dança chamativa ao som de “Não Pode Se Apaixonar” de Xand Avião com participação MC Danny e de DJ Ivis, meses antes de denúncia de violência doméstica pela sua ex-esposa, prisão e soltura para aguardar julgamento da acusação em liberdade.

Foram surpreendentes um milhão de seguidores conquistados no seu perfil do Instagram e mais de 4.5 milhões no TikTok. Com grande alcance ela chegou a fazer publicidades nacionais como para o canal TNT em promoção do Oscar 2021, porém é principalmente requisitada por anunciantes da sua cidade Tucuruí e adjacências com destaque para sua influência regional, onde ela ficou muito conhecida e faz “de tudo um pouco”. 

“Nunca pensei que iria ter essa proporção toda [com meus vídeos]. Nunca pensei [ser influenciadora] e me considero uma sim. Por fazer as pessoas duetarem a minha dancinha, já comecei influenciando a algo. O mais legal é receber o carinho das pessoas, conhecer pessoas maravilhosas”, declara Daniele.

Influenciadora Luiza Leal. Foto: Reprodução/ @coisasdeluma

Entrega de soluções

Luiza Leal começou seu trabalho na internet primeiramente conquistando clientes como social media. Formada em publicidade há 4 anos, ela disse que sempre gostou de marketing digital, mesmo que não houvesse disciplinas que explorasse isso na sua faculdade. Na pandemia, ela lançou cursos digitais, o que a ajudou a ocupar a cabeça para estudar os lançamentos e como se comunicar.

Dos seus clientes, uma concessionária de carros não parou os trabalhos, bem como uma loja de lingerie. Com lockdown, as pessoas começaram empreendimentos individuais para terem uma renda extra. Marcas não ficaram de fora e agora pedem divulgação para o atacado.

“Já fiz publicidades para algumas marcas nacionais. Aqui é aquela coisa engessada ainda. O lojista quer te ver na loja, se não para ele não vale [investir]. Eles têm relutância em você tirar o produto da loja para tentar algo diferente. Foco em comercial, no preço. Há relutância em fazer coisa diferente. Dá resultado? Sim, mas não gera conexão, que é minha forma de trabalho. Às vezes eu acabo me sentindo como uma vendedora”, desabafa.

A retirada dos produtos para produzir uma foto ou vídeos para o feed e até stories encontra certa resistência, mas quando fica pronto o resultado, não dá para resistir às locações naturais de Santarém e Alter do Chão, distrito turístico da cidade. “Estou na missão de educar meu cliente. Depois que eles entendem meu trabalho, eles permitem que eu faça isso de inovar”, ressalta Luiza.

Por ter o trabalho fora das redes sociais, Giuliana Ferrari não faz publi posts. “Eu simplesmente indico coisas que se encaixam na minha rotina de forma bastante simples”, confessa. Porém, ela não deixa de divulgar marcas e de ser requisitada, mesmo que para permutas. 

“O que posso afirmar com certeza é que a frequência de pessoas procurando esse tipo de serviço aumentou. Recebo DMs [mensagens diretas no Instagram] diariamente de empresas verificando a possibilidade de postagens de seus produtos/serviços”, explica. A procura vai para os encaixes de seus nichos por lojas que atuam em sua cidade, São Mateus, ou na região norte do ES: desde lifestyle, maternidade e organização até casa, mesa posta e receitas.

Influenciadora Giuliana Ferrari. Foto: Reprodução/@giulianaaferrari

Precificação

Precificar todo trabalho no meio digital não é tarefa fácil. “Eu seguia as blogueiras e uma delas falou que trabalhava com isso [de precificar stories e publicações], e me deu dicas falando sobre engajamento e que daria para trabalhar com isso”, começa falando a acreana Jéssica Ingrede.

Quando era professora ela chegou a receber R$ 800 mensais. Após as dicas da colega influenciadora, ela foi abordada por uma loja, mas não sabia quanto cobrar. Fechou quatro visitas e quatro posts no feed por R$ 200. A lojista aceitou. A essa altura, Jéssica estranhou o valor, mas fechou a parceria. No final, acabou tendo gastos com Uber e fez compras para na própria loja. Mal viu os R$200. “Não vou querer mais não, vou ser professora”, ela disse para si mesma na época.

Ao consultar a influenciadora que disse que ela poderia trabalhar na internet com o engajamento que ela entregava, esta falou para ela cobrar R$ 700. “Eu falei, ‘maninha ninguém vai pagar 700 reais nunca’. Fiquei com medo, não acreditava em mim”, justifica.

Ela foi para outra loja, fez reunião, falou o valor e eles aceitaram. As mesmas quatro visitas e quatro posts no feed. “Nem acreditei. Saí de lá e contei para o meu marido: ‘Aceitaram 700 reais o mês. Se eu conseguir mais uma loja dessa eu desisto de ser professora e vou ser blogueira’.”

Com um celular mais simples com a câmera traseira quebrada, já que na época ela não tinha iPhone, ela entregou o prometido. “A loja super acreditou em mim. Sou grata até hoje, a primeira loja que pagou realmente o que eu pedi. Depois abriu portas a ponto de eu trabalhar só como ‘blogueira’, nem sabia que daria. Hoje esse trabalho mudou a minha vida, a vida da minha família. Fez eu conquistar coisas que eu nem imaginava”.

“Esse trabalho aconteceu de uma forma espontânea, mudou minha vida radicalmente”, afirma Jéssica. Hoje, ela cresceu tanto que teve muito mais portas abertas: foi para o São João da Thaynara OG em 2018, no Maranhão, no lugar de outra influenciadora de Rio Branco que não pode ir; em 2019 viajou para Bali, na Tailândia, e em 2021 para Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, para trabalhos com a marca Sapatinho de Luxo; e em dezembro de 2021 marcou presença na Farofa da Gkay, evento da também influenciadora, atriz e humorista Gessika Kayane, que neste ano ocorreu no Ceará. Marcado pelo movimento de influenciadores e famosos que trocaram seguidores entre si, ela saiu da Farofa e chegou a ser notícia em portal no Acre. 

Influenciadora Jéssica Ingrede. Foto: Reprodução/ @jessicaingrede

Há preço para o sucesso?

Issaaf Kharawi é autora do livro “De blogueira a influenciadora” e identifica quatro etapas profissionais: vanguarda, legitimação, institucionalização e profissional. “Essas etapas, apesar delas representarem um momento histórico muito específico, elas são cíclicas em alguma medida”, explica a pesquisadora. A etapa da legitimação talvez seja a que influenciadoras regionais passam com mais evidência, até se estabelecerem perante os clientes e o público. 

“Eu fui uma das primeiras influenciadoras da minha cidade e perdi todo um preconceito com meu trabalho. Eu era a menina ‘que queria se aparecer’. Perguntavam o porquê eu estava fazendo isso. ‘Ah, ela deve ser rica para ir em loja só para ganhar roupa’, além de comentários desnecessários e machistas. Mas isso melhorou muito”, acredita Luiza Leal.  

“Quando eu comecei de verdade há seis anos o termo influenciador digital nem existia. Era mais o termo blogueira. Usavam o termo ‘blogueirinha’ na minha cidade, como uma forma de diminuir o meu trabalho, porque nos bastidores a gente sabe que tem de organizar financeiro, criar conteúdo, falar com cliente. É um trabalho de agência se você não pode contratar uma pessoa. Eu sentia que meu trabalho tinha que mostrar para as pessoas que eu não era apenas uma blogueirinha. Não deixava tanto me diminuir, mas me incomodava sim”.

Issaaf explica essa necessidade de mostrar esse lado mais profissional: “A gente vive um imperativo da visibilidade, ou seja, não basta você ser um bom profissional se você é um profissional autônomo, você tem que deixar isso evidente, você tem que dizer pras pessoas, você tem que tornar visível esse seu bom desempenho de trabalho. Por isso circula esse discurso de que viramos todas blogueirinhas, porque há essa convocação. Ao mesmo tempo, o blogueirinha deixa evidente que existe um espectro de visibilidade. E alguns estão em espaços mais altos nesse espectro de visibilidade. Enquanto outros estão embaixo”.

“Levando em conta que é possível que todos tenham visibilidade, mas nossa atenção não pode estar direcionada para todo mundo, há disputas nesse espectro de visibilidade. […] Então talvez até a chegada de um número que as pessoas consideram representativo, as produtoras de conteúdo vão passar por um momento de rechaço, de piada, de diminuição do trabalho e serem apelidadas de blogueirinha”, complementa. 

Quando ocorre a primeira parceria comercial, aparições na mídia local como fontes ou destaque midiático, há então a legitimação, com o reconhecimento frente ao público, ao mercado e a toda área de abrangência delas. Em meio a isso, o trabalho do produtor de conteúdo acaba sendo uma alternativa para aqueles que engrossam os altos índices de desemprego e não há trabalhos com carteira assinada, embarcando assim em empreendimentos digitais. 

“Ser produtor de conteúdo também é uma possibilidade para muita gente, uma vez que nós temos um mercado profissional, um mercado de trabalho extremamente precarizado, […] a possibilidade de empreender no digital acaba sendo quase uma boia de salvação para muita gente”, explica Issaaf. Muitas vezes essa virada, que demanda tempo e até mesmo dinheiro, pode acabar nem engrenando de fato. “Talvez você nunca chegue nesse espaço aspiracional. Esse trabalho aspiracional, ele exige investimento de tempo, investimento até de dinheiro, de força de trabalho para recompensas incertas, às vezes improváveis”.

Felizmente essa etapa foi superada por aquelas que hoje chegaram em um patamar de trabalho relativamente confortável e com retornos, como por exemplo, Jéssica Ingrede, que alimenta constantemente seus stories com produção de conteúdo diários conseguindo manter seu público e clientes de vários ramos como farmácias, óticas e até material de construção. Contudo, isso veio após ela também passar pela fase de ser chamada de blogueirinha.

“Quando eu comecei, havia muitos olhos tortos. […] ‘Ah, quer ser a blogueirinha’. Só que eu nem ligava, seguia e fazia minhas coisas. As pessoas usavam esse termo porque muitas vezes elas querem diminuir mesmo. Quando você está embaixo, ninguém te apoia tirando amigos e sua família. Foi o que aconteceu comigo”, lembra.

“Eu era uma blogueira que mostrava o outro lado, não era de classe alta, modelo nem miss. Geralmente as meninas que trabalhavam com internet [em Rio Branco], elas tinham sido misses na minha cidade, frequentava outros lugares. Eu não era nada disso, era da baixada, andava de moto”.

Até mesmo críticas ao conteúdo que ela criava no começo, mais voltado para baixa renda, ela recebeu. “Muita gente soltava piadas entre eles. Eu descobria. Não ia inventar uma realidade para mostrar nas redes sociais. […] Teve gente que disse que eu só estava passando vergonha na internet. E hoje, né?! Estou passando vergonha ainda, com 200 mil seguidores”, responde aos críticos.

Jéssica Ingrede. Foto: Reprodução/ @jessicaingrede

Desafios: cancelamento e posicionamento

“Tenho muito hater. Fico me perguntando como a pessoa perde o tempo dela criando um fake ou só destilando ódio mesmo. No início eu ficava bem chateada, ficava me perguntando porque a pessoa não gostava de mim. Já recebi falando do meu corpo, dos meus filhos”, relata a acreana, que já até chorou devido aos comentários que via, como o de que ela estava grávida apenas para “engajamento na internet”.

“A pessoa não se olha e não se enxerga que somos todos seres humanos que erram para caramba. Todo dia a gente erra. Imagina se filmássemos essa pessoa que também fala mal do outro, ela também seria cancelada. Acho que esse negócio de cancelamento é banal. A gente vive pisando em ovos”, constata Jéssica, afirmando que acredita que nunca foi cancelada.

“Quanto mais exposição, mais vigilância. Quando mais o sujeito expõe a própria vida, mais suscetível a vigilância ele está. Então, a gente pode pensar tanto em vigilância algorítmica, até vigilância de seguidores, de pessoas de fato. Às vezes de grupos de ódio. É algo que anda junto, com certeza. E o cancelamento gera uma autovigilância, aquela preocupação ainda mais reforçada ao conteúdo, aquilo que se diz, ao discurso. Essa é uma questão importante a se considerar”, ressalta Issaaf.

Jéssica Ingrede perdeu amigos para a covid-19. “A pandemia mexeu com o psicológico de muita gente. Hoje graças a Deus e a vacina, a situação está muito melhor. Desde o início eu acredito na vacina, como eu queria que tivesse chegado antes. Como eu queria que as pessoas tivessem levado mais a sério. Se algumas pessoas tivessem levado com tanta responsabilidade o momento que estamos vivendo, muitas coisas teriam sido evitadas”.

“Como influenciadora eu falei no início. Muita gente me segue e me assiste, tenho que dar bom exemplo e fazer o melhor. Imagina o maior influencer do País não dar exemplo?”, questiona ela, fazendo referência ao atual presidente brasileiro Jair Bolsonaro. “No início falei que não gostei da postura do presidente. Para quê?! Teve gente que me chamou de hipócrita, já pensa que a gente é de partido A ou B. Tem pessoas que não sabem o que é opinião”.

Ela acha importante se posicionar, mesmo que não possa se expressar na maioria das vezes, seja por não ter tanta propriedade nos temas retratados, seja para evitar conflitos. “Acho isso um saco, porque se as pessoas fossem mais democráticas, elas iam escutar o outro”, opina Jéssica. Luiza Leal, de Santarém, também costuma se posicionar.

“Eu me posiciono mais nos stories. Quando eu me vacinei eu coloquei as hashtags vacina e fora Bolsonaro. Tem que ser espontâneo. Desde que senti ter que falar alguma coisa eu falei. Mas enquanto não foi de coração eu não fiz. […] Por vezes dou uma militada e perco seguidores, lojas me respondiam. Tento dar vozes para os movimentos, antes tinham protestos e eu nem sabia”, justifica ela, falando que hoje ajuda a divulgar quando há atos em sua cidade e sente que isso é uma forma de ajudar. 

Luiza Leal. Foto: Reprodução/ @coisasdeluma

Importância regional

Potencializando seus mercados locais, as influenciadores regionais desempenham importante papel na consolidação de novas marcas ou de empresas de suas localidades que querem alcançar novos públicos presentes no digital. Mesmo aqueles que possuem impacto nacional, como é o caso de Daniele Lopes, seu foco se direciona para trabalhos locais de alcance imediato do público dali presente em seus perfis e que é possível checar pelas métricas de redes sociais, como o próprio Instagram.

“Eu acho que isso [da influência regional] é muito interessante da gente observar, porque algo que sempre se discutiu a partir das pesquisas sobre comunicação digital, foi o aspecto da internet ser global e local em simultâneo. Os primeiros teóricos sobre a internet falavam sobre isso assim, em como a internet era local”, explica Issaaf Karhawi. 

“Acho que os influenciadores regionais […] eles mobilizam muito bem esse atributo essencial da internet que é algo local. Que é algo que é local, que é de uma região ou que é de uma cidade, ou que é de um estado e algo que [pode ser] maior, que é maior. Não precisa nem ser global. Esses aspectos ficam muito evidentes e a internet é isso”.

E no uso desse atributo que a internet sem barreiras físicas possibilita usar da audiência conquistada para apoiar causas, estabelecer conexões genuínas entre marcas e potenciais compradores (os seguidores), também entra nesse aspecto a importância de todos aqueles que em algum momento conquistou seu espaço no digital, independente de seguidores altos ou não. “A blogueira nacional é importante, mas a regional também é aqui dentro da minha cidade e cidades vizinhas”, conclui Luiza Leal.

Por Caio Santana / caiosantana@usp.br